A Viagem de Chihiro

Já a bastante tempo tinha o filme “A Viagem de Chihiro” na minha lista de favoritos do Netflix, mas nunca o assisti. Não sou um grande conhecedor de mangás e animes, mas assistindo aquela pequena sinopse que o streaming fornece, me senti atraído pela trama e o guardei nos favoritos para algum dia em que achasse interessante vê-lo.

Capa Japonesa do Filme!!

A propósito, costumo escolher os filmes e séries por esses pequenos trechos, tomando para as séries o número de temporadas como segundo fator determinante. Se houver muitas e ainda estiver em produção, via de regra, pulo fora. Também acho determinante os primeiros 20 minutos do filme, já desisti de muitos filmes que aparentavam serem bons nos resumos e sinopses e terminavam sendo uma chatice de se ver.


Enfim, depois de protelar bastante, estava sem nada para fazer durante a tarde de Domingo e resolvi dar uma chance para o filme.

Era assistir a um filme ou ver Corithians x Atletico Paranaense, preferi o filme.

Enredo do Filme

Chihiro é uma jovem garota que está de mudança com sua família. Seu pai resolve pegar uma estrada de terra para chegar mais rápido a sua nova casa, mas acaba chegando em uma construção antiga, que mais parece um templo. Ele acredita que é a passagem para chegar a nova vila e adentra o recinto.

A passagem misteriosa.

Chihiro não quer entrar naquele local, algo internamente a faz sentir que há algum perigo, (portal estranho e escuro com uma estátua doida na frente, você entra??) mesmo assim segue sua família.


Um parêntese aqui para tratar desse tipo de loucura que ocorre muito em filmes. Porque diabos os grupos sempre entram nesses recintos que parecem masmorras ou casas assombradas?? Nunca entendi isso, principalmente nos filmes de terror, parece que o cara está buscando confusão kkkk.


Eles passam por um portal e chegam ao outro lado, onde aparentemente existe uma vila em uma campina muito bela, mas sem moradores. Mesmo assim, existe um cheiro que atrai a família a um restaurante vazio, cheio de comida gostosa e suculenta.

Os pais de Chihiro começam a se empanturrar do alimento, que é prontamente negado pela menina. Ela decide explorar o local em busca de moradores e chega a uma ponte, dando de cara com um menino chamado Haku, que a ordena a sair rapidamente dali, enquanto ainda não anoiteceu, porém já não há mais tempo, Chihiro volta e descobre que seus pais viraram porcos e que no entorno começam a aparecer espíritos.

Pais de Chihiro após se tornarem porcos.

Ela tenta fugir, mas percebe que a campina virou um lago e já não há como chegar ao outro lado. Haku, então, a ajuda dizendo que aquele local é uma casa de banhos termais para espíritos governada por uma feiticeira que não suporta humanos, mas que se ela encontrasse um trabalho poderia sobreviver, pois a aceitariam, mesmo que a força. (Aparentemente a feiticeira, chamada de Yubaba, fez um juramento de aceitar qualquer um que pedisse trabalho)

Diz para que ela busque Kamaji, o operador das caldeiras e peça trabalho. Ela vai até as caldeiras e se encontra com o velhinho operador, que diz não ter trabalho para ela ali, mas que ela falasse com Yubaba se queria tanto trabalhar. Então ele chama Lin, uma trabalhadora das termas e pede que ela conduza Chihiro até a feiticeira.

Ao se encontrar com a velha, ganha o trabalho, mas a condição é que ela perca seu nome, se tornando a partir dali Sen e ficando aprisionada até o fim de seus dias.

A menina começa então a trabalhar na limpeza da casa termal e fazer amizade com Lin, Kamaji e as outras trabalhadoras, apesar de ainda ser muito mal tratada pelos sapos e outros funcionários.

Haku, que é o braço direito da feiticeira e muito desprezado pelos trabalhadores da casa, se vê em Chihiro, mostrando onde guardaram seus pais e lhe entregando um cartão com seu nome. Diz para ela nunca esquecer o nome dela, nunca esquecer quem ela é, pois assim poderá encontrar o caminho de volta para casa.

O resto da história é bem legal, tratando da busca de Chihiro por uma forma de quebrar o feitiço em seus pais e poder voltar para casa.

Considerações

A síndrome de Peter Pan e a fuga da inocência

Lembrei bastante de Alice no País das Maravilhas ao ver A Viagem de Chihiro, existe a magia de atravessar um portal e sair numa terra diferente, habitada por seres sobrenaturais e animais que falam. Existe também a trilha do herói em busca de sair do aprisionamento, achar uma saída do mundo mágico e voltar para a realidade.

Além disso, ambos os personagens são crianças. Crianças nessa fase da vida (10-15 anos) estão numa fase de descoberta, em que tudo parece mágico. Acredito que esse tipo de história seja uma espécie de rito, a passagem da juventude para a proximidade da vida adulta, quando a magia começa a sumir e as responsabilidades começam a bater à porta e a magia que antes era clara começa a ficar turvada.

A busca pela saída do mundo mágico é o reconhecimento de que o personagem assumiu a responsabilidade e adentrou o universo dos adultos.

Hoje, as pessoas se acostumaram a não tomar para si responsabilidades. Alguns dizem que é o reflexo de um mundo de facilidades que amaciaram os jovens, já que não tiveram que lidar com muitos problemas externos além dos psicológicos do “eu”. Daí o surgimento da tal síndrome do Peter Pan, o jovem que está no mundo mágico da infância e se recusa a buscar o caminho de saída, se contentando com a vida sem responsabilidades e sem objetivos, vivendo um sonho.

O sem-face, aquele que tudo absorve

O sem-face.

No meio do filme surge uma criatura nas termas que eu pensei, a princípio, ser um espião de Yubaba. Aparentemente é um espírito sem rosto. Ele devora alguns personagens e absorve suas características.

Isso é bem parecido com o que uma criança faz, copia por exemplo e visualização. O sem rosto se torna ganancioso e avarento perto do sapo e se torna dócil e feliz perto de Chihiro.

O sem rosto é um lembrete de que devemos ponderar nossos atos, pois mesmo que façamos como os jovens dizem, de mandar o mundo a merda, sempre há alguém vendo e imitando nossos atos, mesmo que só nossos pequenos. É um dever moral do indivíduo de dar bom exemplo, pelo menos moral, daquilo que é certo.

O bebê aprisionado

Bebê gigante de Yubaba.

Quando Chihiro pede emprego a Yubaba, conhecemos então o filho gigante da bruxa, Bo. O pequeno é aprisionado em uma sala cheia de brinquedos em que a mãe tenta de tudo para não fazê-lo chorar, mimando e dando tudo que o fedelho pede, entretanto ela o limita aquela salinha, fazendo que ele acredite que o mundo é isso e que as pessoas estão ali para servi-lo.

Acredito que se fosse um filme atual Yubaba proibiria Bo até de comer chocolate, mas daria um Ipad pra ele ficar vendo o dia inteiro episódios de galinha pintadinha sem encher seu saco kkk.

Na parte final, Bo é transformado em um ratinho por um feitiço e acompanha Chihiro em uma grande aventura. Aparentemente, ser exposto ao perigo e ao mundo externo faz bem ao bebê, que volta da viagem mais maduro.

Talvez essa seja uma crítica ao modo como criamos nossos jovens (da época e, acredito, serve perfeitamente para o atual estado das coisas), dentro de pedestais, onde eles não sofrem com situações adversas e se tornam adultos pouco corajosos.

Yubaba e Zeniba, duas faces da mesma moeda

Yubaba têm uma irmã gêmea que se chama Zeniba. Os moradores da casa termal têm um medo gigante de Zeniba, provavelmente causado pelo ódio que Yubaba nutri por sua irmã.

Porém, no final, percebemos que Zeniba é muito mais honesta e honrada que Yubaba, morando em uma casa simples no pântano.

Para mim, parece que Zeniba é a parte boa de Yubaba e que ambas são uma só. Ela é aquela parte honesta e simples que, as vezes, precisamos esconder para não sermos julgados pelos outros, é aquela parte que fica em casa quando saímos para trabalhar, é a alma nua e crua.

Trilha Sonora

A trilha sonora do filme também é muito boa. A composição é de Joe Hisaishi e interpretação pela New Japan Philarmonic. Serve como música de fundo para o trabalho no dia a dia e em alguns momentos é cheia de emoção. Abaixo deixo o link para o Youtube, mas também pode ser encontrada no Spotify, procurando por “Spirited Away Soundtrack”.

Trilha sonora do filme A Viagem de Chihiro

Acredito que vale muito a pena assistir A Viagem de Chihiro, mesmo que só para se divertir numa tarde de Domingo. O filme, que foi a maior bilheteria da história do Japão até pouco tempo atrás (desbancado por Demon Slayer em 2020, quase 20 anos depois do seu lançamento), é um bom filme na lista de desenhos animados para se assistir, mesmo depois de velho, e ainda trás muitos ensinamentos e reflexões, provavelmente existem muitas além das que coloquei aqui.

Abraços e até a próxima.

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Neófito
2 anos atrás

Olá, Mago!

Também demorei e ver o filme. Só o vi com minha filha, pois ela se mostrou interessada e, juntos, assistimos a toda a película.

É um longa realmente digno de todos os elogios recebidos há anos e anos. Encontrei ali muita lição para a fantasia. E assim são as grandes obras de fantasia, cheias de lições morais.

Não havia pensando sobre esses aspectos de formação (da infância à maturidade), responsabilidades etc. Agora me deu até uma dimensão maior da obra.

Você poderia ter gasto quase duas horas apreciando milionários chutando bola. Mas preferiu ver A Viagem… É preocupante como empregamos nosso tempo, ainda mais quando adultos, onde tudo o que temos é sobrevida!

Abraços!

Neófito
2 anos atrás
Reply to  Matheus

Os japas ainda conseguem surpreender com animações. São os melhores nisso, penso. Mas tb não sou um experto em animé.
Já tive minha fase de todo final de noite (todo, mesmo), estar numa mesa de bar, onde jantava, via algumas pessoas e tomava uma. Mas parei há anos. Gosto de ficar em casa ou dar uma passadinha na casa de amigos. Ou recebê-los em casa. E só.
Tb pensei sobre muito isso: o uso do tempo. E desencanei. Se o cara bitolar no assunto, acaba apenas vivendo frustrado.
Abraços!

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